Rodrigo da Silva Ferreira
Fevereiro 20, 2023
Entidade Empregadora ou Trabalhador? Quem é responsável pelas despesas relacionadas com os olhos e a visão?
Na ordem do dia tem estado a problemática da obrigatoriedade de as Entidades Empregadoras terem ou não de suportar os custos com exames de oftalmologia, bem como com dispositivos de proteção dos olhos e da vista dos trabalhadores. Na sequência de uma decisão do Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia («doravante TJUE»), de 22 de dezembro de 2022 e cujo foco do litígio residiu no recurso interposto por um trabalhador Romeno contra a Entidade Empregadora, que exigia o reembolso da despesa relacionada com os seus óculos graduados, surgiu uma enorme discussão pública, alimentada por várias notícias na imprensa, sobre quem tem o ónus de suportar esses custos.
Tal questão já se encontra legislada no âmbito internacional pela Diretiva 90/270/CE Conselho de 29 de maio de 1990, tendo sido transposta para o âmbito nacional pelo Decreto-Lei nº 349/93 de 1 de outubro.
Com base no Decreto-Lei, nomeadamente, o artigo 7.º, sobre a vigilância médica, “antes de ocuparem pela primeira vez um posto de trabalho dotado de visor, periodicamente e sempre que apresentem perturbações visuais, os trabalhadores devem ser sujeitos a um exame médico adequado dos olhos e da visão. Se os resultados do exame referido demonstrarem a sua necessidade, os trabalhadores beneficiam de um exame oftalmológico e sempre que os resultados dos exames médicos o exigirem e os dispositivos normais de correção não puderem ser utilizados, devem ser facultados aos trabalhadores dispositivos especiais de correção concebidos para o tipo de trabalho desenvolvido”.
Considerando que a legislação supramencionada não define quer dispositivos de correção normais, quer dispositivos de correção especiais, existiu a necessidade de recorrer à interpretação do acórdão do TJUE, que define dispositivos de correção normais como sendo “dispositivos que são usados fora do posto de trabalho e que, por conseguinte, não estão necessariamente relacionados com as condições de trabalho. Assim, tais dispositivos não servem para corrigir perturbações visuais relacionadas com o trabalho e podem não ter uma relação específica com o trabalho em equipamentos dotados de visor”.
Por outro lado, define dispositivos de correção especiais como um meio de corrigir ou prevenir as perturbações visuais que um dispositivo de correção normal não pode corrigir ou prevenir.
Os trabalhadores devem receber tais dispositivos de correção especiais se não puderem ser utilizados dispositivos de correção normais para corrigir as perturbações visuais, sendo que a necessidade de atribuição destes dispositivos de correção especiais está dependente de exames adequados aos olhos e vista no âmbito da medicina de segurança e saúde no trabalho.
Ou seja, caso exista um diagnóstico que ateste a necessidade de utilização por parte do trabalhador de um dispositivo de correção especial, que incluem os óculos graduados especificamente destinados a corrigir e a prevenir perturbações visuais relacionadas com um trabalho que envolve equipamento dotado de visor, à luz da interpretação do TJUE, os custos deverão ser suportados pela Entidade Empregadora. Importa ressalvar que estes «dispositivos de correção especiais» não se limitam a dispositivos utilizados exclusivamente no âmbito profissional.
Sem prejuízo, e em qualquer caso, na nossa opinião, não devem ser suportadas quaisquer despesas pela Entidade Empregadora sem que haja uma indicação prévia do médico de segurança e saúde no trabalho que permita concluir que as perturbações visuais do trabalhador são resultado da atividade laboral com recurso a um visor no local de trabalho e não de um problema visual anterior.
Mais acresce que a comparticipação das despesas por parte da Entidade Empregadora poderá ser efetuada através de fornecimento do dispositivo ou do seu reembolso, mas nunca através do pagamento de um prémio salarial geral.
Como nota final, importa ressalvar que a presente interpretação teve por base a decisão do coletivo de juízes do TJUE, bem como a legislação ao dispor acerca da problemática, uma vez que não existe jurisprudência portuguesa que aborde esta questão.