Joana de Sá
Noémia de Sousa
Maio 19, 2023
Renúncia a créditos laborais | “fim da remissão abdicativa” | Alterações à Legislação Laboral
Aquando da cessação do contrato de trabalho, a praxis ditava que fosse celebrada uma remissão abdicativa pela qual o trabalhador renunciava a todo e qualquer direito de que, eventualmente, fosse titular, por conta do contrato de trabalho e da sua cessação. Ora, de forma relativamente pacífica, até agora, a jurisprudência tinha vindo a defender que a figura da remissão abdicativa tinha aplicação no domínio das relações laborais, desde que celebrada em data posterior à data da cessação do contrato de trabalho.
Todavia, na sequência das alterações à legislação laboral introduzidas no âmbito da Agenda do Trabalho Digno, o legislador português introduziu um novo preceito no Código do Trabalho, pelo qual veio determinar que os créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação não são mais suscetíveis de extinção por remissão abdicativa, salvo por transação judicial.
O novo preceito aditado ao Código do Trabalho reflete, na nossa opinião, uma versão paternalista perante os trabalhadores, assente na ideia de que, por vezes, aqueles eram impelidos a celebrar uma remissão abdicativa, desconhecendo o conjunto de direitos a que estava a renunciar, e a qual era apresentada pelo empregador como uma condição imprescindível para proceder ao pagamento dos créditos devidos pela cessação do contrato de trabalho, sem prejuízo de outras considerações suscitadas pela aplicação desta figura às relações laborais, nomeadamente no que à irrenunciabilidade dos direitos dos trabalhadores concerne. Na nossa perspetiva, este novo preceito consubstancia uma efetiva limitação ao princípio da autonomia privada e levanta ainda questões relativas à participação na elaboração da legislação laboral, temas estes que, estamos certas, a seu tempo serão sindicados.
Em suma, a partir de 1 de maio de 2023, apenas no contexto da celebração de um acordo judicial é que os trabalhadores poderão renunciar aos respetivos créditos laborais, o que, na nossa opinião, traduz-se, por um lado, num desincentivo para os empregadores em proceder ao pagamento aos trabalhadores da compensação pecuniária global pela cessação do contrato de trabalho pretendida por estes últimos, e, por outro lado, num incitamento à litigiosidade, em prejuízo da pacificação das relações entre empregadores e trabalhadores.