Nuno Oliveira Santos
Novembro 16, 2022
As despesas das empresas que podem não ser consideradas custos fiscais no apuramento de IRC
O regime de dedução de gastos e perdas, para efeitos de determinação do lucro tributável, assenta num princípio basilar: a dedutibilidade geral de todos os gastos e perdas, desde que estes tenham sido realizados com vista a obtenção dos rendimentos que são sujeitos a IRC.
Como tal, todos os gastos incorridos e suportados que não obedeçam a este princípio serão desconsiderados fiscalmente.
O art.º 23, nº 2, do Código do IRC, prevê uma lista, a título exemplificativo, de alguns dos gastos que, tipicamente, são fiscalmente dedutíveis, desde que cumpram com a condição essencial de serem realizados com vista à obtenção de rendimentos que conformem o lucro da empresa.
Tal não significa que, para serem fiscalmente relevantes, os gastos tenham sido geradores de proveitos. Bastará que tenham sido suportados ou incorridos com a intenção de obter rendimentos sujeitos a IRC, o que se compreende, pois, visando as empresas a obtenção de lucro, os gastos realizados devem ter em vista esse fim, e não fins estritamente pessoais ou externos.
Como tal, a dedutibilidade fiscal exige uma apreciação do gasto e da sua afetação à prossecução do interesse da sociedade, que levará à desconsideração como gastos fiscais daqueles que claramente não tenham a potencialidade de gerar um incremento dos rendimentos, independentemente do (des)acerto do ato de gestão que tenha motivado o gasto.
Tome-se o exemplo de uma empresa que apresenta na sua contabilidade gastos associados a uma viagem para um destino paradisíaco. Se a empresa não conseguir provar que essa viagem e os gastos associados tiveram como objetivo a obtenção de rendimentos, como uma viagem que se destine a reunir com potenciais clientes para a empresa, então o gasto será desconsiderado para efeitos fiscais.
O aspeto-chave será sempre a demonstração de que o gasto foi realizado com vista à obtenção de rendimentos, através de documentação que comprove essa realidade, sem prejuízo de a Autoridade Tributária, ainda assim, não considerar os gastos como fiscalmente aceites e proceder a uma liquidação adicional de imposto (obviamente sujeita a impugnação perante os Tribunais).
Quanto aos gastos não dedutíveis, o legislador já prevê, no art.º 23-A, do Código do IRC, um conjunto de despesas que não são fiscalmente aceites, como, por exemplo, as despesas não documentadas ou as multas e coimas que resultem de infrações extracontratuais ou de condutas contrária à regulamentação da sua atividade, e que ajudam a clarificar a priori que gastos é que as empresas podem deduzir fiscalmente.
Para além disso, no âmbito do Orçamento do Estado para 2023, e por força da crise inflacionista que atravessamos, foi proposta a criação de um regime extraordinário de apoio aos encargos suportados com consumo de eletricidade e gás, com o objetivo de ajudar as empresas a lidar com o aumento dos custos de energia e o impacto dos mesmos nas suas estruturas de custos.
Nesse regime, o Governo prevê que os gastos referentes a consumo de eletricidade e gás natural, na parte em que excedam os do exercício fiscal anterior, podem ser majorados em 20%, para efeitos de determinação do lucro tributável, com exceção das empresas que desenvolvam atividades que tenham um volume de negócios de, pelo menos, 50% nas áreas da produção, transporte, distribuição ou comércio de eletricidade ou gás, e a fabricação de produtos petrolíferos, refinados ou a partir de resíduos, e de aglomerados de combustíveis.
Ou seja, considera fiscalmente gastos que não são aceites em condições de normalidade.
Em suma, o pilar da dedutibilidade fiscal das despesas das empresas é a sua realização com vista à obtenção de rendimentos sujeitos a IRC, sem prejuízo de o legislador poder definir que gastos são ou não aceites, e também, consoante o contexto socioeconómico do país, em que medida é que estes são aceites, e de que forma.
A dedutibilidade fiscal das despesas suportadas pelas empresas é das matérias mais complexas no âmbito da fiscalidade, visto que apenas com a análise do caso concreto se logrará concluir se determinada despesa deverá ser, ou não, considerada como gasto.